domingo, 13 de março de 2011

O que ainda nos choca tanto o caso Isabella?



Isabela Nardoni morreu aos cinco anos de idade. Segundo as investigações que prosseguem, a menina foi atirada do sexto andar de um edifício na zona norte da São Paulo pelo próprio pai e a madrasta. A classe média, em estado de choque seletivo, mais uma vez se vestiu de branco e foi pedir paz na Avenida Paulista e na praia de Ipanema. Nesta semana, quase três meses depois da morte da menina, três jovens pobres, negros, moradores da favela da Providência no Rio de Janeiro foram entregues a traficantes do morro da Mineira por oficiais do exército. Lá, foram torturados e mortos de forma bárbara, no sentido mais lato da palavra. Os moradores da comunidade onde os três garotos moravam, entraram em confronto com a polícia local.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, pediu desculpas às famílias das vítimas como quem pede desculpas por ter quebrado um copo ou ter chegado atrasado a um encontro com subalternos. É bem provável que daqui a um ou dois meses o caso seja esquecido como já aconteceu com tantos outros. O que certamente não ocorrerá com o caso Isabella: ela se tornará um símbolo na luta contra violência, como o garoto João Hélio, morto em um assalto em 2007. É evidente que uma vida não é mais importante que outra. Pelo menos na teoria.
Os meios de comunicação em massa selecionam casos como esses entre milhares que ocorrem todos os dias no Brasil. Depois divulgam “a bola da vez” e arquivam os outros. E isso se repete na memória coletiva. Alguns casos causam comoção geral na população e outros são simplesmente deixados de lado. Os perigosos supostos assassinos de Isabella Nardoni estão presos, assim como Suzane Richthofen, mas o que aconteceu com os assassinos dos garotos da Candelária? Com o caso Sandro, sobrevivente do mesmo massacre, morto no episódio que ficou conhecido como o assalto do ônibus 174? Com os policiais que mataram sem-terras em Eldorado dos Carajás? Ou com os que invadiram o Carandiru em 1992? Alguns destes casos ainda viraram roteiros para o cinema e os outros, alguém se lembra?
Macbeth é tão trágico quanto Édipo e Medéia. As forças armadas têm diante da população o dever ético de protegê-la, assim como os pais perante os filhos, embora a palavra ética esteja fora de moda. Os oficiais do morro da Providência têm que ser punidos com o mesmo rigor que o casal Nardoni, pois cometeram um crime ainda mais hediondo e covarde. Não atiraram ninguém pela janela, é bem verdade. Preferiram nem mesmo sujar as mãos. ... (C.M, 20 Jun. 2008, Outono).

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