domingo, 11 de março de 2012

Passadas

  
E passa a mulher, com o seu cheiro adocicado, personagem de García Márquez. Ruidosa e opulenta. Ela era a rainha e não sabia que uma revolução estava sendo ensaiada. Até o dia em que tiraram-lhe a coroa e levaram o seu trono para o estábulo. Deixaram-lhe lá como a senhora única do quase nada. Ela continuou a sorrir, mas não sabia mais o que fazer. Logo ela que havia sido sempre tão inocentemente desnecessária... Antes optara pelo infindável ócio, porém tinha um lugar no mundo dos que produziam. E agora?! A vida era apenas um amontoado de horas que tanto custavam a passar. Tão tola! Continuava a sorrir, quando deveria gritar! Como o animal acuado e ferido que se tornara. Porém, essa lenta agonia não alimentava mais do que algumas passadas pelo reino que lhe arrancaram. No meio daqueles que a olham entre o respeito consagrado aos monumentos e a piedade sordidamente oferecida aos fracassados. Em seus passos pesados carregando o resto de si mesma como um aleijão ou uma velha valise emprestada, ainda vai aos mesmos lugares, nos mesmos dias e horários e traz sempre consigo o perfume do que já passou. Um punhado de flores mortas e um traje de núpcias em uma manhã de luto. Sem ao menos entender o que ocorreu. A rainha continua. Caminha, caminha lentamente com o seu cheiro adocicado, ruidosa, opulenta e desnecessária. Caminha, ainda sem saber, para frente da guilhotina que flameja afiada a luz do sol do meio dia. (C.M. 19 Maio 2010, Outono)                       

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Insônias


E a vida aos poucos volta ao normal e vai ao encontro do comum de si mesma. Sem mais as cores alucinantes das noites de serestas e boemia ou as manhãs melancólicas de sol e preguiça. Só a vida afinal, carregada de sua matéria bruta a sua inequívoca essência: as possibilidades... (C.M. 24 FEV. 2012 , quase fim de Verão)