terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Morremos todos nós...



Não morri na madrugada daquele domingo em Santa Maria. Pelo menos não morri sozinha, mas morremos todos nós asfixiados por tanta culpa junto aos 231 meninos e meninas que só queriam se divertir. Assim, como morremos todos nós em Eldorado dos Carajás junto aos 19 integrantes do MST e morremos com os 111 presos do Carandiru, assassinados de forma brutal e covarde pela policia. Morremos, também, com as meninas indígenas obrigadas a vender o seu corpo em São Gabriel da Cachoeira, ou a cada 20 minutos quando uma mulher é estuprada na Índia ou na África do Sul. Morremos com tantas companheiras vítimas do machismo e do descaso das autoridades do mundo e nesses casos por nos calar, também, as matamos. Morremos ao permitir que a reputação de uma mulher ainda seja julgada pela supressão ou não de sua sexualidade, por ainda escutarmos sem gritar que “não” quando alguém nos diz, “que mulher direita não faz isso ou aquilo!”. Morremos juntamente com o ciclista pobre atropelado pelo filho do milionário e morremos com as crianças estadunidense vítimas não apenas de um lunático, mas de todo um sistema político que torna a posse de uma arma mais importante do que a segurança real de seu povo. Morremos com todas as balas perdidas e a negligência médica, com o preconceito, a exploração infantil, o analfabetismo e a homofobia. Temos nossos corpos surrados em meio às luzes das avenidas mais importantes do mundo por termos coragem de amar, simplesmente amar a um igual. Morremos com o preconceito daqueles que se dizem religiosos, mas não sabem amar, compreender ou perdoar. Morremos na Cracolândia ou nas filas de atendimento por uma consulta médica em qualquer cidade do Brasil. Morremos por sermos jovens, por sermos pobres, por sermos negros, por sermos mulheres, por sermos gays, por sermos latinos, por querermos ser livres. Morremos com as balas da polícia, somos todos vítimas do esquadrão da morte e agora, também, das milícias. Morremos ao presenciar o que foi feito no Pinheirinho e em tantos incêndios criminosos em favelas. Morremos com a impunidade, com a corrupção, com o descaso em relação à educação, com a compra de votos e a compra de vagas nas universidades. Morremos nas enchentes do Rio de Janeiro e igualmente morremos na eterna seca do nordeste. Morremos com nossa herança escravocrata e coronelista, sentindo o chicote cortando a nossa carne e o peso de nosso legado racista que ainda olha com desdém para o culto ancestral de nossos deuses africanos e que leva uma criança a pedir a sua mãe para lhe alisar o cabelos, pois esse é “ruim” ou a querer uma Barbie loira como sua “filhinha” na hora da brincadeira. Morremos o tempo todo juntamente com essa sociedade vazia e putrefata que construímos e que agora nos torna reféns, imersos nas “redes sociais”, nos “reality shows”, na absurda necessidade de consumir mais - sempre mais e, assim, morremos sem causa ou motivo real e ao contrário de outros que morreram antes de nós deixando ideias que ainda permanecem, miseravelmente morremos estéreis. (CM, 29 de Janeiro de 2013, Verão)

Agora é pra valer!!!