sábado, 1 de outubro de 2011

Amanhecendo ou fim de agosto

Ela já estava ficando irritada! Faziam mais de cinco minutos que tentava abrir a porta sem sucesso algum. Do outro lado do quarto, ele ressonava. Havia parado de roncar, como fizera a noite toda, mas com toda a certeza ainda dormia. Enquanto ela mexia nervosamente a chave girando-a de um lado para outro. O movimento foi ganhando força até que a tramela da porta soltou-se e caiu no chão. Nessa hora, ouviu-se o barulho do metal batendo agudo no piso e ele automaticamente começou a repetir em uma voz quase inteligível: “para a direita!”, “vira a chave para a direita e gira, também, a tramela!”                                                                                                                                 
Ela suspirou fundo e num fio de voz, que não conseguia esconder sua irritação, disse: “eu não consigo...” Ele meio que contrariado, levantou-se da cama com um salto, foi até a porta e com um movimento simples abriu-a, balbuciando um “bom dia!” insólito, o qual ela nem se deu o trabalho  de responder.                                                                      
E como quem acabara de acordar de um sonho ruim, saiu caminhando apressadamente para a rua. Não sabia exatamente o porquê, mas precisava do sol e de tudo mais que formava o mundo lá fora como nunca precisara antes. A noite havia sido toda ela uma promessa interrompida. No sábado, quando chegara ali, ela realmente acreditava que tudo que eles necessitavam era um do outro e de tempo para estarem juntos.                                                                                                                       
Mesmo sendo tão diferentes, os dois se amavam. E isso era o mais importante! No entanto, o que se deu depois mostrou o quanto ela estava enganada.                                      
Ainda o amava e apesar de tudo, sentia-se correspondida. O amor ou o desamor não era o problema entre eles e sim as formas tão desencontradas de amor. Sim, eles realmente eram muito diferentes e amavam-se de formas imensamente distintas. O que não significava amar demais ou amar de menos, mas apenas amar de maneira própria.                      
No início, talvez pelo encantamento natural que o amor causa nos seres humanos ou talvez por mera distração, quem sabe, nenhum dos dois deu-se conta disso. A única coisa que perceberam-se é que eram humanos e que sorriam mais quando estavam um ao lado do outro ou que no meio da tarde quando o sol começava a recolher-se lembravam-se mutualmente e ainda que encontravam-se em letras de músicas ou trechos de velhos poemas.                                                                                                           
Porém, pouco a pouco foram intimizando-se. E começou a acontecer o que sempre acontece com seres distintos que apesar de suas inúmeras diferenças ousam amarem-se. Então, longas conversas a respeito de desapontamentos, frustrações e mágoas profundas tomaram o lugar dos risos, dos pores do sol e da poesia.                                  
Agora, agiam como pássaros com as asas cortadas que apesar de quererem voar não mais conseguiam... E mesmo se pudessem voar para onde iriam? Por mais atraente que o céu apresentava-se, existia algo ali que competia com todo o azul infinito e misterioso. E por isso, não conseguiam soltar-se, entretanto ainda precisavam de mais do que aquilo que um podia dar ao outro.                                                                                  
Fora isso, havia a sensação de estarem permanentemente em crise. Submersos em uma espécie de substância espessa e lodosa que possuía vida própria e por mais que tentassem não conseguiam desvencilhar-se desse estranho pântano.                                     
 Tudo agora era um céu muito escuro de uma noite sem luar ou ao menos alguma estrela distante apontando o caminho. Já era quase inicio de setembro e aos poucos todo amor ia escapando e esvaindo-se no ar de forma brutal e desesperada. E, talvez, por todo o desespero que os inundava já não conseguiam vislumbrar mais por quanto tempo ainda seriam eles dois.
(CM, ainda é Invernos em 2011)

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