sábado, 1 de outubro de 2011

Um dia de sol e um copo d’água ou Divagações sobre o talvez...

Naquele momento, ela sentia uma necessidade quase plausível de fugir, partir para o mais longe que pudesse. Um lugar em que ele não pudesse encontrá-la novamente. Tudo entre eles estava muito bem! Amavam-se. Quase sempre se entendiam, também, eram amigos, amantes, parceiros e estavam juntos. Muito juntos, há alguns meses; o que alimentava algumas expectativas por parte dos mais próximos.
E era justamente aquela aura de perfeição que a enlouquecia, desestabilizava-a. Ele não era o seu primeiro ou segundo grande amor, nem tão pouco uma daquelas paixões avassaladoras, que mantinham sua garganta seca e seus olhos úmidos. Era sim um homem comum: trabalhava, estudava, lia jornal, gostava de futebol e de beber com os amigos em noites ermas. Esquecia fatos, nomes e datas que considerava irrelevantes, porém, eram fundamenteis para ela. Mas, fora isso, segurava firme em sua mão e, às vezes, com ternura e outras com desejo abraçava-a enredando-a em uma atmosfera de felicidade que beirava o divino.
O mais tortuoso era que a latente necessidade de fuga vinha acompanhada de outra mais visceral que era a da presença e a do afeto dele; com seu olhar por vezes perdidos e sua voz quase infantil. Ela precisava-o e, também, o queria longe. A única coisa a perceber-se é que longe ou perto: o queria.
Os dois não se conheciam há muito tempo, entretanto a calma que habitava nesse enlace era já muito e muito antiga. Dentro das despretensiosas conversas na estreita cama cercada por paredes brancas ou no banco de alguma das tantas conduções que precisavam pegar diariamente, entendiam-se com perfeição mesmo quando descordavam. E até mesmo em meio ao silêncio entrelaçavam-se. Tudo na mais perfeita ordem! Em uma calmaria outonal...
Talvez, fosse essa estranha e refinada sintonia que a perturbava tanto! Logo ela, tão acostumada ao conturbado: lágrimas e juras desfeitas. Via-se agora a navegar, segura, por um infinito mar de águas tranquilas a caminho de um por do sol muito dourado e isso a desesperava.
Fora isso, já havia percebido há algum tempo que dessa vez não podia controlar a situação e muito menos prever os acontecimentos vindouros. O que é que vem após o ‘felizes para sempre’?! Inquieta, indagava-se. Porém, não havia resposta alguma.
E por isso, o fim parecia ser mais fácil, já que a esse ela conhecia muito bem! Essa dor era sua conhecida, ao contrário da continuidade inusitada e, deste modo qualquer sofrimento era preferível e menos sofrível a aquela alegria, tão estranha a seus olhos.
Talvez, por isso tinha tanto medo de ficar com ele. Talvez, por isso tinha tanto medo de perdê-lo. E, talvez, por esses tantos medos o, então, inesperado veio chocar-se a estável rotina estabelecida. E de uma hora para outra o vento que soprava brandamente encheu-se de uma descomunal força de levante e começou a levar todas as dúvidas que habitavam o seu mundo para o mundo que dantes eles contemplavam tranquilos. Já não mais concordavam ou mesmo conseguiam dizer-se como antes. Agora, um distanciamento crescente nas proporções de um buraco negro primordial entre aqueles dois amantes, tão próximos, tão sólidos. Assim, as conversas vinham inundadas por silêncios e quase soluços e uma nova dor a qual nem mesmo a ela era familiar tornara-se sua nova companheira. Em vão, ela tentava recordar-se do momento exato em que tudo começara a mudar, não conseguia. Em vão, ela tentava encontrar um ponto de equilíbrio em meio aquele turbilhão que sua vida se tornara, não encontrava. Em vão, ela tentava reatar o que se quebrara, não sabia como.
Mais uma vez, sentia-se só e perdida, no entanto, dessa vez havia uma diferença peculiar que a estraçalhava sem que ao menos ela pudesse identifica-la.
Talvez, deve-se isolar-se. Talvez, deve-se procurá-lo e dizer tudo o que sentia. Mas, sabia que aquela força aninhada entre sua cabeça e sua garganta não romperia para fora de si, pois aquele emaranhado de pensamentos difusos e desconexos era seu demais para mostrar-se a quem é que fosse. Assim, ela ia aos poucos compreendendo o quão inútil era debater-se. Tinha a nítida sensação de estar afogando-se e sabia que ninguém poderia salvá-la.
Não havia respostas para tantas perguntas em nenhum dos tantos livros que lera ou mesmo nos filmes ou músicas os quais tanto amava. Apenas mais e mais perguntas surgiam em sua cabeça, então, era apenas isso...?! A paz antes tão assustadora fora suspensa e em meio a uma nova guerra ela capitularia e como o Minotauro de Borges simplesmente aceitaria o seu destino.

(CM, quase Primavera em 2011)

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